A década de 50, dos governos de Getúlio
Vargas e Juscelino Kubitschek que fomentaram o processo de industrialização
nacional. Da vitória do Brasil que ganhou a Copa do Mundo de futebol, em 1958.
A década da esperança, da industrialização, do rádio, da televisão e da
velocidade. Mas, o símbolo maior deste processo de modernização foi a
construção de Brasília, inaugurada em 1960, o ano que fui estudar o ginásio em
São Luís.
Em Itapecuru, uma junta governativa assume,
no lugar de João Rodrigues, que só consegue tomar posse em 1952 e Sinéas de
Castro Santos que o sucedeu, de 1956 a 1961. Em
nossa cidade, o marco mais importante da
década de 50, foi a construção da ponte sobre o rio Itapecuru.
Em
1950, enquanto o mundo era reconstruído, após a Segunda Guerra mundial, meus
pais, seguindo a tendência daquela época do êxodo rural no Brasil, mudaram-se
da Mata para a cidade. Eu que nascera em 1944, estava com apenas seis anos. As
dificuldades que atingiram o mundo, o Brasil e o Maranhão, chegaram até a minha
família e fizeram que o casal tomasse a decisão de mudar-se. Meu pai, dono de
engenho e minha mãe dona de casa, com sete filhos, numa região que não havia
escola, queriam muito vê-los estudando.
Foi um recomeço difícil. Com a mudança,
construção da nova casa e o nascimento do oitavo filho, o sonho do casal de
colocar os filhos na escola só se concretizou em 1955, depois de conseguir
registrá-los. As cinco filhas, mais
velhas, já alfabetizadas, estudaram na escolinha que ficava perto da estação do
trem, com a professora Maria de Lourdes Matos.
Mesmo assim, não havia clima de desânimo. Meu
pai, Euzébio Alberto da Silva, trabalhava no engenho com meu irmão mais velho e
minha mãe, Rosenda Matos da Silva, cuidava dos filhos. Os mais velhos ajudavam
com os menores. Não faltávamos às festas religiosas, começando com a de São
Benedito, dia 1º de janeiro, Divino Espírito Santo, da Santa Cruz, de Nossa
Senhora das Dores e a Semana Santa, não exatamente nesta ordem. Minha mãe que
também costurava, caprichava no figurino da filharada.
Cursei
o primário no Grupo escolar Gomes de Sousa, entre 1955 e 1959, do primeiro ao
quinto ano. As colegas do quarto e quinto anos, eu já com catorze e quinze de
idade, eram várias. Entretanto, tínhamos um pequeno grupo que se reunia para
estudar. Cada vez em casa de um. Outras vezes íamos para a casa de Dona
Santinha (Anozilda) ensaiar os números das festas cívicas. Do grupo lembro-me
de Sônia e Oswaldo Camelo, Francisca e Conceição Bezerra. Eu era mais próxima a Francisca Bezerra
(Chiquita), razão pela qual estou escrevendo este artigo, a pedido do neto
dela, Breno Bezerra que, ao me ouvir falar das nossas peripécias de
adolescentes, nas quais estavam incluídos o Sr. Carlos Bezerra e Dona Cotinha.
No primário tínhamos homenagens cívicas todos
os dias, antes das aulas. A cada dia uma série era encarregada de fazer a
apresentação, com textos lidos de acordo com a efeméride.
Lembro-me das professoras de cada turma: No
primeiro ano, D. Santinha, no segundo, D. Maria do Rosário, no terceiro, D.
Maria de Lourdes e D. Conceição, no quarto e quinto, D. Francisca, irmã da
professora, Maria de Lourdes.
Os ensaios das atividades cívicas eram feitos
em casa da diretora, Anozilda (Santinha), aonde a maioria das professoras que
vinham de fora se hospedavam. Numa mesa enorme, com dois longos bancos,
sentávamos para ensaiarmos nossos números: Uns cantavam, outros recitavam
textos e o grupo cantava várias músicas em coro. Até hoje sou apaixonada pela
poesia de Casemiro de Abreu, “Meus oito anos” que sempre era cantada nas
comemorações. As festas das mães até hoje me emocionam, quando ouço as músicas
que aprendi no primário e cantava para minha mãe.
D. Santinha morava pertinho da casa do
alfaiate e músico, Carlos Bezerra. Quando terminavam os ensaios, Francisca me
convidava para irmos a sua casa. Lembro-me de suas irmãs mais velhas:
Conceição, Maria e Malvina.
Dona Cotinha e o Sr. Carlos eram muito simpáticos.
Entrávamos pela porta da varanda, ao lado direito da frente da casa, onde o Sr.
Carlos tinha algumas mesas forradas para o jogo de cartas. Eu deixava minha
bolsa com material escolar sobre uma delas e enfiava-me pela casa, junto com
Francisca e Conceição.
Em
casa dos Bezerra tinham algumas novidades que me encantavam: água puxada com
uma bomba manual (quebra-galho) armazenada em toneis, dentro e fora do
banheiro, que ficava no anexo a casa. Eu achava o máximo. Tão diferente dos
nossos banhos no Rio Itapecuru. Eu achava divertido acionar a bomba para cima e
para baixo e ver a água jorrar.
Eu tinha verdadeira atração pelo fogão a
lenha, também no anexo a casa, em direção à outra porta de entrada, ao lado
esquerdo da frente. D. Cotinha cozinhando, as labaredas altas, quase cobrindo
as panelas e o cheirinho gostoso de café que nos servia com bolos e doces
feitos por ela.
Eu costumava me espelhar em frente à alta
penteadeira ao canto direito da sala, me via de corpo inteiro e como toda
adolescente, me virava de um lado para o outro me admirando de todos os
ângulos. Um dia, estava eu nesta atitude narcisista
quando o cunhado de Francisca, marido de Maria, entrou na sala e disse que
soubera do nosso banho de rio e que as meninas disseram que eu tinha um corpo
muito bonito. Fiquei encabulada e Francisca disse-me que comentara sobre nosso
banho no Rio Itapecuru, após o trabalho escolar e de apanhar verdura na grande
horta da minha mãe para que todos levassem de presente.
Ao final de 1959, terminamos o quinto ano.
Tivemos festa de formatura, meu paraninfo foi Benedito Nascimento, esposo de
Adélia, prima de minha mãe. Antes do exame de admissão, no Colégio São Luís,
fiz aulas de reforço com o professor, João Rodrigues, no Grupo escolar “Gomes
de Sousa”, em horário especial.
Francisca e Eu fomos estudar o ginásio em São
Luís. Acabamos nos perdendo de vista; encontramo-nos duas ou três vezes nas
férias. Em 1962, me casei e fiquei em São Luís. Depois, mudamos para São Paulo
e mais tarde para Santa Catarina. Ao voltar a Itapecuru, dez anos mais tarde,
procurei Francisca e matamos as saudades, num longo papo. A Chiquita escrevia
belas poesias. Fico curiosa de saber se chegou a publicá-las.
A menininha que saiu da Mata, do engenho do
pai aos seis anos, em 1950, em maio completará 72 de muito trabalho, estudo, e
militância literária. Com textos publicados no Brasil, Portugal, Espanha e
França. Tudo, graças àquela iniciativa dos pais de se mudarem para que os filhos tivessem oportunidade de estudar.
Agradeço ao confrade Breno Bezerra pela
curiosidade de conhecer alguns detalhes da minha convivência com seus
familiares.
Praia do Anil, Magé – RJ, 28 de fevereiro de
2016
Benedita Azevedo